sexta-feira, 31 de março de 2017

Poemas de Ivo Pereira


Quadro de verão


O amarelo do trigo
confunde o raio do sol.
O azul do céu
reflete
os olhos dos versos.
Uma árvore na solidão do campo:
uma pintura impressionista
na tessitura de cores e flores.
Nascem imagens puras
na ponta dos dedos.
Uma moça na paisagem
com uma sombrinha aberta
pingo de tinta
no pincel borrado do pintor.
Namorados abraçam a solidão.
Um corvo voa com gritos
a buscar o resto
de semente no chão.
A paisagem pintada
faz Van Gogh renascer
na transparência da poesia.


Santa ceia mineira


Um balde sobre a mesa
Pede posta a ceia insossa.
Sobre a tábua há garfos longos,
Pratos fundos e vazios.

A fatia do pão de gergelim
Foi cortada com o punhal do traidor.
O vinho tinto foi servido em copos de cristais
Banhados com raminhos de urtiga.

E alguém pediu cachaça com imburana
E fumou um cachimbo político
E comeu um bife podre com sangue.

A carne assada foi servida a rigor
No prazer eterno do pecado e da dor.
Dizem que os anjos comem peixes


Quintal


Cortaram as goiabas brancas
Do meu pequenino quintal.
Deixaram somente as verdes
Morrendo com as podres no chão.
Os galhos secaram tristes no sol
Minha infância sangrou no facão.

Os pedaços da vida azeda
Que eu comi com os olhos:
São muitos os doces frutos da terra
E os frutos da terra são doces eternos.

Queimaram o pomar encantado do poeta
E deixaram na alma a cor seca do carvão.

Podaram as flores da primavera
E mataram o fruto quase maduro.
Não se esqueceram de amassar
Com as mãos as raras sementes.


Lágrimas barrentas


“Vale, vida, verde, verso e viola”,
canta o violeiro
nos encontros e nas festas
pelas estradas vermelhas.

Vale o rio de areia branca,
quanta dor Jequitinhonha.

O tropeiro
com entulhos de tralhas,
o berrante solitário
chama a boiada.

A canção da terra,
a poeira nos olhos cansados,
sem ouro e nem diamante,
gente sofrida
na vida
no tempo
e na história.

O rio chora
águas sujas,
a chuva não cai
nos montes sem árvores,
a sede sufoca
a goela vazia,
lágrimas barrentas
na alma do povo.


Milho Verde


Igreja do Rosário
delicado cemitério
fascinante paisagem
a sombra do Itambé
arbusto rasteiro
mágico momento
lá no horizonte
a primeira estrela.
Lajeado vai para o mar
sempre-viva
sempre bela
sabiá canta a manhã
por do sol
abraça a vida.
Lá no céu
de muito longe
estrela cadente
grama verde
casa calhada
mãos sofridas
paredes de tabatinga
telhas antigas
um belo sonho
olhos de anjo
no silêncio profundo
encantado lugarejo.

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