Sete poemas de Ivo Pereira do livro
Rabiscos marginais (1974/1984)
Poesia
Poesia:
Uma palavra presa
Na garganta:
Espinho de peixe
Da ganância
De comer
Versos soltos.
Era
A minha cueca vermelha
No arame rasgada pelo
tempo
Mostra o triste
sofrimento
Do homem do século XX.
A minha existência
perdida
Pendurada no varal da
vida
Revela o famigerado
momento
De um ser com medo do
mundo.
Grito
Todos os meus poemas
Rabiscos mofados
E retratos de um tempo
E todas as minhas
canções
Solitárias e
impressionistas
Nasceram de uma
profunda solidão.
O homem não quer
Morrer no anonimato.
Cerimonial
Posta a mesa
Decorada com dor:
Taças, pratos,
Olhos de um sonhador,
Sonhos de um pecador.
Garfos e facas
No altar da vida:
Cortam-se os pulsos
E bebem-se vinhos,
O sangue dos homens.
Bostagem
Aqui
jaz um poema
Que
o poeta cagou
Pacientemente
No
papel amassado.
Aqui
jaz um poema
Chapiscado
Com
restos da podridão
De
um ser imundo
Que
suja o mundo.
Existe
poema que é uma merda,
O
poema mole é uma merda dura,
Uma
merda qualquer é um poema,
Existe
poema que é uma merda
E
o poeta – um fingidor -
Não
impede a tragédia.
Sem título
Espaço livre
A quem quiser
Escrever um poema
Sem distinção de cor.
Porque o poeta
Não carrega rancor
Em sua frágil escrita
Aceita as críticas,
Não chora e nem grita.
Guerrilheiro
O poeta
É aquele incansável
marciano
Que tenta de todas as
maneiras
Invadir a poesia,
explorar as letras,
Vasculhar o papel e
dominar o país
A arma branca
Que o poeta usa
Não fere a carne do
homem
Apenas incomoda
Sua mente vazia
Que não percebe nada
além
De seu próprio umbigo
A poesia não quer
mexer
Com seus sentimentos
Quer atingir
dolorosamente
Seus pensamentos.
Poema
Tento captar
O irreal da fantasia,
Distante da percepção,
Mas me perco
Ante a falsidade
Do sonho.
Uma vontade
De sugar algo que não
está
Impregnado no papel
Mas a folha está
branco
E o papel amassado
Com versos rabiscados
No absurdo vazio do
silêncio.
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