Sete poemas de Ivo Pereira do livro
Rabiscos marginais
Tarde
na Avenida Um
Envolvido pelo
quebra-luz
Do impressionante
entardecer.
Estou aqui sentado no
muro
Dessa avenida quase
asfaltada.
Leio um livro de
Drummond
E esse sabiá cantando
assim
Me comove de chorar.
Uma vontade enorme
De escrever um poema.
Rabisco um troço sem
rima
Seco,
Feito os cascalhos da
rua,
Rua imensa
Que assusta o menino.
Enquanto isso bandidos
Roubam Brasília.
Decididamente prefiro
lutar
Com as ideias do livro
Que leio na tarde
quente
De domingo
Na Avenida Um.
Humano
É a noite que o poeta
No vazio dos
sentimentos
Procura abrigo no
papel.
As coisas que o cercam
Já não o aquecem
mais.
É preciso um calor
Além da imaginação,
Quase real,
Humano,
Demasiado engano.
Russamérica
Não é um paraíso:
É uma quadrilha
De homens ambiciosos
Que exploram o mundo.
Não há liberdade
nesse lugar,
Ali as rosas não
nascem
E as flores que
resistem,
Exalam fumaça de
guerra.
É uma terra infértil
E contaminada
Com elementos nocivos
À humanidade.
Clara
Branca é a pomba
Que desce voando
Como pena caindo
Buscando o lençol
Claro no varal.
Branco é o leite
Que escorre suave
Pela página do livro
Pintando o resto
Do poema
Que ficou
Com o arroz
No prato de louça.
Branca é a tinta
Na parede clara
Que reflete a lágrima
No rosto
De uma criança
Sorrindo ao nascer
Como cor indefinida.
Como se fosse livre
Pelas montanhas da
terra
Vou louvando o que sou.
Passarinhos que voaram
Liberdade não voltou.
Asas que voam suaves,
Ave branca milenar,
Vem pousar na fantasia
E no poema me libertar.
Das amarras de um novo
tempo
Quer se acertar no
mundo
Momentos de dolorosas
incertezas
Nos ninhos sufocantes
Nas cidades perdidas de
concreto
Aves serenas miram
outras paisagens
Com asas abertas e
penas molhadas
O poeta deseja o sonho
absurdo
De estar solto em seu
quintal
Se sentir livre
Com sua poesia
Um homem sufocado por
um país
Que não sabe que ele
existe
Busca o que na vida
Sem perspectivas de
nada
Além de planos
impossíveis
O que resta é voar na
poesia
Sem medo de perder os
sonhos.
Abertura
Em cada ponto de ônibus
Um povo sofrido
Jovens agitados
Um país sufocado
Uma nova revolução
E em cada gaveta vazia
Sem poemas escritos
Fotografias em preto e
branco
Borradas e amareladas
Pelo implacável tempo
Lembranças mofadas
Tocos de lápis
quebrados
Pedaços de borrachas
Coleções de pedras
E manuscritos apagados
Com uma velha
instrução:
liberdade.
Engano
Não me venha
com besteira
que esse verso
Eu nunca fiz
absorvo
a seiva azeda da raiz
da mensagem abstrata
esculpida na incerteza
de buscas solitárias
indecisos pensamentos
versos inseguros
que o poeta cuspiu
na certeza da solidão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário